Meu nome?
Me chame como quiser!
Sou filho de Mané:
nego home,
ignorante que nem a peste
mas um exímio pescador
que, inda por cima é bom na lida
espinho que se preza
não teima
com ele:
calumbi
jurema
mal vizinho
juazeiro...
home de sangue quente
que não
foge de peleja
ou morre ou mata.
Esse por sua vez é irmão de:
Tonrege, [ou tonho],
zé Carlos
Valtinho
Meu Pinho
Sila
Gusta
Zéza
Ró
e a nega Lú - preta de
cria
não era boa pra casar
era boa na cama [de palha seca
ou mato deitado] e na lida.
Me ensinara a arte da safadeza.
Esses, por sua vez, filhos de Tico
[meu vô, caburé da cara larga]
também atendia como Chico do
pó
como era conhecido em Cedro
[Aqui, não me refiro a madeira de
lei
e sim a cidade do santo]
"Cedro de São João”
que já
fora Darcilena.
Mas, isso é coisa de muitos
anos
nem nascido inda era.
Pois bem,
O véio Tico andou também com
seu comboio
[de burros]
por
outras terras:
Poço dos Bois,
Telha,
Amparo,
Canhoba,
Aquidabã [antiga Cemitério]
e inté Propriá.
E nas Alagoas, onde também era
pescador:
Porto Real do Colégio
Tibiri [terra de índias e
caboclas desavergonhadas]
São Brás...
Meus bisavôs de pai
nem nome sei
o que sei é que o pai, do pai
do meu pai
era home valente:
no braço
na faca peixeira
na
carabina...
e na luta franca.
E a mãe, do pai do meu pai
minha bisavó de pai
sei apenas que era índia.
Selvagem! Nunca vira gente
fora criada pelos seus como
bicho no mato
vivia na caatinga, no mato
fechado...
Foi pega no laço
e foi como tudo começou
num sexo selvagem
indecente
imoral
obsceno...
embaixo de um juazeiro
a vista só dos bichos.
Já, os pais da mãe de meu pai
sei deles não
é a parte de sombra das lembranças
[mais é um povo da tez alva, galego da venta e os beiço pocado].
Minha mãe se chama Maria
e seu segundo nome é Carmo
em homenagem a santa.
É descendente direta dos
Juremas.
Meu avô de mãe
atendia por João Félix
homem
alto e magro
era um típico sertanejo
mas não era
de briga não
ao menos, isso soube do meu
pai, que inda dizia:
- nem os bichos que comia
tinha coragem de matar!
Pegava-os na arapuca.
Minha avó de mãe
atendia pela alcunha de Dona
Antônia rezadeira
mulher de média estatura
mas
viva, bem diferente do marido.
Era boa por demais com os
netos
gostava mesmo era do arroz
doce de domingo
dos geladinhos que me dava
e da frutas tiradas no pé
no quintal grandão que perdia
de vista.
Era onde costumava brincar
quando aparecia alguém pra rezar
e ela dizia: - vai lá pro quintal menino
senão o olhado passa pra ti.
Perdi a véia pequeno
mas inda lembro com saudade.
Os pais dos pais de minha mãe?
Nunca ouvir contar sobre eles
acho que eram agricultores
talvez, diaristas de algum fazendeiro da região.
Sendo honesto, sei lá!
Quando souber eu
emendo essa história.
Da junção carnal de Mané e
Maria [meus pais]
Nasceram:
Zanza*,
essa foi a primeira, nasceu no
oiteirinho
numa casa de barro
era moça
bunita
das coxas grossa
embuchou antes de casar
quase que mata o Mané de
desgosto.
Mas, isso é passado
hoje,
vive bem com Bobinho
e é funcionaria pública.
Betão,
o segundo
[esse tem história
que não cabe nessa história]
era menino home:
brigão
raparigueiro nato
iniciou na safadeza
inda quando era home de calça
curta
e teve como professor tio Valter.
Tinha vocação pra ser
home de Lampião
e olhe lá se não assumisse o
comando do bando.
Herdou vários ofícios de: vô,
pai e tio
[bom de briga, montar cavalo, caçar, pescar, mexer com gado, atirador exímio, criar galos de briga...]
e como ironia do destino é
puliça.
Belezal,
ou Magia, ou Júnio, ou ainda
“J”.
Negrinho metido
e boçal
mas, como dizia Mané
bom de enxada que era um
pestinha
esse sempre foi dengoso
mirado
reclamador que vixe maria.
Porém, era bom nos estudos
foi o
primeiro da casa
a ter faculdade e emprego de
gente [hoje todos tem estudo]
Nena,
essa quase o porco come quando
inda era criança
era um tipo estranho
e pra
completar começou a ouvir vozes.
Sai pra lá!
Inda pensou ser freira
mas no
fundo, gostou não.
ainda bem que arrumou um
Buneco pra sua vida.
A próxima é Dente
ganhou o nome devido à saliência dos dentes
dentuça igualzinha a
Mônica mas
já se curou da feiura.
Também era chamada de Miyagi
San
porque era menina home:
corria
brigava
ganhava queda de braço dos
meninos
e se a briga era com outra
mulher
batia de mão fechada
com o
grosso dos dedos na cara.
Sempre fora minha parceira em
todas as disputas
na corrida, nos estudos [quem
ficaria com o primeiro lugar]
ela foi sem dúvida meu maior
adversário
hoje, continua home: na garra,
na coragem, determinação...
coitado do Marcelinho Pão e
Vinho.
Por último e não menos
importante
Pipiu,
a caçula
dengosa
chorosa
de pouco apetite pra comida e
pras coisas do mundo também
religiosa
temente a Deus
acho inté que ganha do Papa na fé.
Habilidosa nas letras e no
pensar
e, de certo, se não amalucar
tem grande futuro.
Vixe!
Inda falta as sementes
dos filhos de Mané e Maria.
Mas, essa parte fica proutra
ocasião.
Quanto a mim? O que queres
saber?
Sou o caçula dos home, isso basta!
* Os nomes em negrito são apelidos caseiros para, respectivamente, Elizângela, Luiz Alberto, José Alberto, Rosângela, [eu ficaria aqui na cronologia], Ângela e Adriana.
[José Ailton Santos]