quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

EU, CANDIDATO!? SÓ NESTES TERMOS.



Naquela manhã acordará com um sentimento diferente dentro de mim. Tinha dormindo apenas seis horas durante a noite. mas a sensação era de que havia vivido décadas. Na verdade, a sensação era semelhante a ter vivido uma vida inteira. Cheguei ao meu estabelecimento comercial às 06hs:00min em ponto, era mais cedo que de costume, estava com um semblante e disposição poucas vezes vista, pois a maioria das vezes chegava com um sorriso pícaro na face. Fato esse, que deixou minha esposa, funcionários e clientes atônitos. Pedi a um dos funcionários que fechasse a loja, apesar de estar no início do expediente, enquanto pedia a minha esposa que ligasse para convidar os demais funcionários que estavam de folga para vir trabalhar naquele exato momento.

Todos se olhavam sem entender muita coisa. Porém, ninguém ousava perguntar nada, apenas executava o que fora pedido. Com o estabelecimento fechado e todos os funcionários reunidos, resolvi fazer o comunicado. Agradeci a presença de todos e, oportunamente, pedi a ajuda dos mesmos para por em movimento um sentimento que desejaria torná-lo, não só um projeto pessoal, mas um estilo de vida. Na peroração do discurso fiz, aos presentes, um último pedido, que não me enchessem de perguntas e apenas se alinhassem ao projeto. 

Após o discurso majestoso me pus a detalhar o projeto, de modo a deixar claro qual o propósito e como deveria ser executado. Após a explanação dos detalhes operacionais, vieram as primeiras determinações, que foram: ajustar o preço de todas as mercadorias, de modo que, o lucro não ultrapasse 20%, o atendimento realizado pelos funcionários, à população, deveria ser realizado como se esses estivessem atendendo a si próprios e, por fim, que não houvesse qualquer tipo de distinção entre pessoas... fixado os mandamentos pétreos do estabelecimento, deu-se início aos trabalhos.

O nome fantasia, que antes existia, fora substituído pela seguinte frase latina, Quae sunt Caesaris, Caesari. Após essa mudança, os negócios iam de vento em proa, o número de clientes aumentaram, meus funcionários trabalhavam com grande satisfação e meu patrimônio não parava de crescer. E, num certo dia, enquanto comemorava o entrar de um novo ano, acompanhado de minha família, funcionários e amigos, alguém me fez a seguinte pergunta:

- que você fez para que seus negócios andem tão bem?

 Houve um instante de silêncio, pois todos ansiavam em fazer a mesma pergunta. A resposta veio em seguida a um sorriso de canto de boca, que revelava não haver motivos para segredos. Contei a todos, que apenas passei a cobrar 20% de lucro nos preços dos produtos, sendo que 10% era o meu quinhão pelo trabalho realizado e 10% era devolvido às pessoas da cidade de formas e maneiras as mais variada possíveis. Pois, julgava ser de bom alvitre e equidade devolver na mesma medida, tudo aquilo que as pessoas tinham me dado.

Foi neste instante, que me sugeriram ingressar na política local. Aqui, começa outra parte da minha história. Refleti durante toda noite sobre a ideia e após convicto, comuniquei a família e aos amigos que aceitaria o novo projeto. Porém, com uma condição, sairia candidato a prefeito da cidade usando dos mesmos sentimentos e valores, com os quais administrava minha vida e meu comércio. Alguns menearam a cabeça como que anunciando o fracasso, outros tentaram argumentar caminhos diferentes, alegando que fazer política seria bem diferente de administrar um comércio. 

Mantive inabalável minha decisão e nada do que dissessem mudaria minha opinião a cerca do intento traçado. Na ocasião, respondi as sugestões e opiniões fazendo uma pequena observação. Falei-lhes que as leis regentes da vida humana são imutáveis, inclusive, são as mesmas que agem sobre os negócios e sobre a política, pois as duas atividades são feitas por homens, ambas fazem uso do dinheiro da mesma forma, inclusive, valendo-se de sentimentos bons e ruins para atingirem seus fins.

Filiei-me a um partido qualquer. Afinal de contas, não havia necessidade de escolhas, pois não via diferença entre eles. E me pus a tocar adiante o projeto. Intensifiquei as visitas às pessoas da cidade, visto que, se tratava de hábito antigo [apesar de que, as pessoas pouco notam a mudança repentina de comportamento em alguns candidatos, trata-se de uma lei natural, se um lobo diariamente passa próximo ao galinheiro, as galinhas tendem a se acostumar, o ato ganha ares de natural e depois...] e, uma a uma, ia percorrendo a cidade, distribuindo a mesma atenção a todos. Nessa via sacra, igual médico, ia tomando nota das dores alheias.

Àqueles que me pediam dinheiro, pois tinham-me na condição de homem de posses, dava aos mesmos a seguinte resposta: 

- Se a condição para votar em mim for que lhes ofereçam dinheiro, sugiro que procurem outros candidatos que assim desejem tratar. 

No entanto, sem perder a calma e a beleza romana típica dos retratos de casamento, chamava atenção dos munícipes para os riscos e consequências dos seus atos, pois são comportamentos semelhantes a estes, que vós me apresentais, que promovem a manutenção e agravamento das ruins condições em que vivem. Por certo, quando a semente é ruim, jamais o fruto será bom.

Quando estava no palanque a discursar, a direção da minha fala era a mesma da que se valia para falar com os populares nos momentos reservados, ou seja, era um homem que se comportava no claro, da mesma maneira que no escuro. Ninguém me encontrava com opiniões de tonalidades distintas, seja no púlpito dos palanques, das igrejas, escolas ou ruas da cidade, sempre defendia minhas opiniões com a mesma intensidade e vigor. Fazia esse trabalho, enquanto meus adversários ridicularizavam meu comportamento e tentavam desconstruir a imagem de homem íntegro. Eu tampava meus ouvidos para os adversários e para meus aliados e apoiadores [familiares, amigos e populares sem expressão político-financeira], que insistiam para que revidasse. Recusava-me a sair um milésimo de centímetro da linha traçada por mim.

Chegou o momento esperado, apuração das urnas. Ao cair da tarde, no momento em que o Sol se escondia para dar lugar à noite [parecendo mesmo que estava a se esconder para não ser cúmplice de nada] fora anunciado o resultado. Perdi as eleições por uma diferença de 10%, isso mesmo 10%, dos votos válidos. Quando soube da notícia estava em um povoado próximo dando continuidade ao projeto que havia assumido, a saber, fazer política com doses de humanidade, transparência, ética e, a mais valorosa de todas, verdade.

Meu amigo, naquele instante, olhou para mim e disse:
- Depois de tudo que fizemos e da maneira como fizemos sair derrotado, vamos embora!
De pronto, lhe dei resposta, dizendo:
- Se quiseres ir vá! Mas, eu ficarei até concluir o que vim fazer aqui, pois às vezes é preciso perder para ganhar.

E aproveitei o momento para contar uma história a meu amigo. Certa vez dormiam em um leito duas mulheres com seus bebês, uma delas rolou sobre o filho e o matou, porém pegou a criança morta e pôs ao lado da outra mãe, enquanto tirava a criança viva para deitar ao seu lado. Na manhã seguinte, ao acordarem, a mãe que tinha sido enganada, reivindicou o filho vivo e acusava a outra mulher de tê-la roubado. Como ambas afirmavam ser mãe da criança viva, o caso foi parar nas mãos do Rei, que perguntou as duas quem era a mãe da criança viva. Ambas prontamente afirmavam serem mães verdadeiras. Então, sabiamente, o Rei autorizou que partissem a criança ao meio e fosse dada a cada mãe uma parte da criança. Diante da situação, uma das mães implorou ao Rei que não matasse a criança e que essa fosse entregue para ser criada pela outra mãe, porém a mãe que receberia a criança pediu ao Rei que fosse justo e cortasse a criança ao meio, pois as duas receberiam partes iguais. O Rei, então, avaliou a iniciativa das mulheres e percebeu que a mãe verdadeira era aquela que por amor ao filho, preferia vê-lo vivo nas mãos de outra mulher a recebê-lo morto. Já, a outra mãe impostora, por não ter apego ao filho alheio, tentou passar por justa e honesta, contudo seus planos não vingaram. O que podemos tirar do exemplo dessas mulheres, que somente quem estar disposto a perder pode verdadeiramente ganhar.

- Eu sou o que clama no deserto, minha missão é abrir caminhos para alguém mais puro, pois sou filho de uma geração corrupta e ainda que tente me desvencilhar da sujeira, ainda restará lama em alguma parte de mim.


DOSTOIÉVSKI



Pensei que desejava ser rico,
mas, não era desejo d’alma.

Sonhava em comer, beber...
Tudo em abundância.
Todavia, uma paixão me basta.

Os sonhos de outrora,
não os quero mais.
Afinal, para que servem os sonhos,
senão para afastar os homens de si mesmo.

Uma rapariga linda e formosa!
Era o que mais desejava.
Mereço todos os castigos 
dos crimes que não cometi
Crime e Castigo 
faces [de uma mesma moeda]

Saudaçoes de um amigo
que teima em não se tornar bolorento,
Ailton.



Contudo, queres a verdade,
nem todas as mulheres,
[eram-me suficientes]
Volição: sexo, poder... liberdade!

Flores que caem, já é outono.
Desejo, agora, uma xícara de chá,
amargo de preferência,
quem sabes assim,
afasto de uma vez esses demônios.
Recordações da casa dos mortos 

Respiro longamente, silencioso...
Os amores? Nunca os tive de verdade.
Apenas, convenções, conveniências.
E, uma vida contingenciosa.
O frio siberiano corrói a mente 
petrifica a alma
e amoxicilina as paixões  

Ah! Quanto à vida,
não mais existe.
E se queres me encontrar,
procure-me, talvez, nas ruínas de uma grande dor.


[José Ailton Santos]

sábado, 23 de fevereiro de 2013

GOVERNOS, INJUSTOS POR NATUREZA.



Henry David Thoreau afirma em seu ensaio originalmente chamado, Resistência ao Governo Civil, [onde este texto bebeu até cair] que o melhor governo seria aquele que de modo absoluto não governa. E segue afirmando de modo profético que, quando os homens estiverem preparados, este será o modelo de governo que terão. Thoreau é considerado o criador dessa forma de protesto, que, de forma bem sucedida, foi usada por Mahatma Gandhi no processo emancipatório da Índia e Paquistão. E a partir desse momento ganhou um novo conceito tipológico, sendo conhecido como, princípio da não violência.


Mas, vocês devem se perguntar, o que o vinho tem a ver com a água? Respondo, a depender da sua fé, um pode ser o outro e vice-versa. Todo governo é uma conveniência e, como tal, vez por outra, se torna inconveniente. Como meu leitor é questionador, deve estar me perguntando, como se dá essa inconveniência? E fazendo uso da maiêutica socrática, devolvo a pergunta, há algum indício da vontade dos cidadãos nas ações dos governos [doravante, vou substituir esta palavra por prefeitos]? Para quem, de fato, esses governam?

Enquanto pensam nas respostas, vou falando o que penso. Caso a população possuísse o poder – falo de forma concreta, não me venham tergiversar - de julgar os gestores públicos, que exercem mandatos eletivos, e emitir sentenças, suponho que esses gestores seriam, em sua maioria, condenados. Pois, se julgarmos levando em conta os efeitos das ações desses e não apenas as intenções declaradas, esses mereceriam os piores castigos. Calma, leitor! Não intento, com minha sentença, por fim aos gestores municipais. Mas, não nego, é bem verdade que anseio por um governo melhor do que esses, que aí estão. Olhem para sua cidade, qual a diferença existente entre o anterior e o atual gestor? Antecipo-me, a diferença reside, tão somente, nas caras e bocas, essas por sinal, ávidas pelos melífluos do poder.

Como estou cônscio que um prefeito que atenda aos anseios dos munícipes, ainda não habita na Terra, desejaríamos ao menos, que os atuais deixassem que cada homem pudesse escolher livremente – sem as velhas interferências psico-financeiras – o modelo de gestão e prefeito que mereça nossa reverência. Pois, se isso ocorresse ou vier a ocorrer algum dia, estejam certos que o tipo de prefeito idealizado por muitos [o qual compartilho], se encontraria em processo de gestação.

Você deve estar me rebatendo agora não é mesmo? Dizendo o seguinte, esse camarada é um pessimista, que não é capaz de perceber que as leis estão mudando e prefeitos como os conhecidos no presente, são espécies em extinção. Convido todos os são-paulinos a baterem palmas comigo, palmas para este monstro do otimismo e da sapiência humana. Palmas! Palmas! Leis? Desafio alguém a me provar, que exista uma lei, uma só, que tenha convertido homens desonestos no contrário? Que tenha convertido água em vinho. Será que existe algum crente aí, que possa me apresentar um miraculum lex [milagre da lei] sem cair no universo da ortodoxia?

Diante da ausência de exemplos reais. Sigamos viagem por estas veredas. Não precisamos de líderes de madeira, vazios de princípios e de caráter. Não precisamos também de homens que nos sirvam de maneira amputada, apenas com seu intelecto, sem o envolvimento espiritual e afetivo. Os municípios sergipanos, quiçá do Brasil, precisam de prefeitos que sirvam a comunidade nos moldes do que declarou Artur Shopenhauer, é preciso encontrar políticos que vivam PARA a política e não DA política. Afinal, esses sim serviriam aos nossos propósitos, pois não se sujeitariam a serem feitos de tecido, linha e palha.

Todavia, por onde devemos começar, pela mudança dos gestores ou da maneira com fazemos política? Há meios de um homem entrar para a política do seu município sem desonra? Sem mácula de caráter moral e principiológico? Como será possível a um candidato, de caráter duvidoso ou não, que fez uma campanha alicerçada em alianças e favorecimentos mal intencionados, fazer uma boa gestão? Respondo previamente, que este candidato não será eleito sem desonra.

Desta forma, não podemos criticar o eleito se este foi vencedor com o nosso voto e apoio. Não posso querer curar-me de um mal causado por mim mesmo. Diz os antigos boticários, que a diferença entre o remédio e o veneno está na dosagem a ser aplicada ao problema, logo, precisamos encontrar a medida certa, a pessoa certa, para extirparmos o mal que consome lentamente a vida do organismo vivo [o corpo social].

O avançar do mal torna este nosso dever ainda mais urgente. Pensando racionalmente, o problema não se resume apenas, a saber, se existem pessoas tirando proveito do dinheiro público - que serviria para ajudar na educação, saúde... da população mais necessitada -, o problema maior é saber que este câncer se desenvolve a sombra dos nossos cuidados,  no jardim da nossa casa, inclusive, continuamente sendo regado por nós.

Como outrora fui cobrado por não expor soluções, segue uma, nós cidadãos devemos resistir aos ganhos aparentes do câncer político, que se desenvolve em cima da nossa fraqueza moral, ainda que, isso custe nossa vida, pois, só assim, mudaremos esse quadro terrível de miséria humana, moral e ética. Ou continuaremos como afirma thoreau, andando continuamente como um indivíduo que pratica ato sexual por dinheiro, bem vestido, que se preocupa com a aparência física, enquanto arrasta a alma pela sujeira e imundície da vida.

Por ora, falo por mim, malo mori quam foedari*



* Antes morrer do que desonrar-se.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

PECADO





Para minha irmã Adriana e nossas reflexões pela madrugada.


Por que devo sentir inveja
daqueles que acreditam
só existir é necessário
para ser pecador.

Eu não!

Quero ter direito
direito de pecar
e comer desacompanhado
do medo ancestral de faltar
Quero roubar o fruto das mulheres
para alimentar meus músculos
saboreá-lo e sentir prazer.

Quero a fúria irascível 
e a preguiça mental
não quero ter crise de consciência.
Mas, a soberba de quem é superior.

A mim não basta ser pecador
quero mesmo é pecar
Quero sentir o pecado 
como a chama da cratera do vulcão.

Quero:
o excesso
a volúpia 
o poder
o sexo impudico
em um lugar 
num escuro qualquer
sem lua e sem Deus
a nos vigiar.

E a certeza de que ninguém baterá
em minha porta 
empunhando uma foice
e sem aguardar
consentimento
estar comigo.


[José Ailton Santos]

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

A PRAIA

O mar vinha às quedas,
feito bêbedo,
os coqueiros geométricos
dançavam feito criança, 
o vento moleque cantava
e brincava com a areia.

As mesas e cadeiras vazias,

os guarda-sóis fechados,
os garçons ao longe
nos olhavam atentos
à espera de um sinal.

Estávamos a sós

e a distância que nos separava
era menor que a nossa timidez.

Olhava-a por trás dos óculos,

dividido entre ambas belezas,
a do lugar e a dela.

O Sol,

apreensivo e cheio de anseio,
após tantas horas
cansou-se da apatia
e resolveu se recolher.
Ela, então,
tomou a iniciativa
e foi embora.

[José Ailton Santos]


FILOSOFIA ESTOICA OU CRISTÃ, A QUEM COMPETE LEGISLAR?*



Desejo muito boa noite aos que apreciam este espaço pluricultural e aos que, por acaso, estejam a visitá-lo pela primeira vez. Agradeço com a devida honra ao autor e moderador deste blog, José Ailton, pela oportunidade de disponibilizar este espaço para uma publicação de minha autoria. Espero, sem negar o peso da responsabilidade, não frustrar os leitores do blog e seguir o ritual do titular do espaço virtual e fornecer mais um manar – esse é o conceito que tenho dos textos já publicados neste blog - capaz de despertar e provocar nos leitores o envolvimento e a colaboração para a construção de um espaço, sólido e promissor. Ambiente esse onde a crítica funciona como bússola na busca pela tão sonhada autonomia intelectual.

Meu desejo é que este texto possa convidar a todos para uma reflexão a cerca de duas formas pelas quais se busca entender e interpretar o universo e a ideia do seu surgimento. Tendo como ponto de partida a filosofia, essa Musa inspiradora, que embebedou no passado os filósofos gregos ao ponto desses – particularmente os estoicos - considerarem o divino como uma representação do equilíbrio cósmico, ou seja, o divino seria aos olhos desses filósofos uma estrutura harmoniosa do cosmo, e, sendo essa harmonia uma característica perfeitamente imanente.

Além da harmonia cósmica, a natureza, segundo os mesmos filósofos estoicos, constituía o verdadeiro modelo de conduta, que por sua vez, alicerçava-se na ética e esta se relacionava diretamente com o equilíbrio da natureza. Os gregos, dizendo melhor, os estoicos, não é menos verdade, se inspiravam na ordem cósmica e desenvolvia sua vida de forma moderada e dessa forma, o corpo estético, a moral e a política se desenvolviam em sintonia com os ensinamentos da própria natureza, que intimamente se mantinham em equilíbrio constante com o Cosmo/divino.

 O axioma máximo dos gregos era corpo sadio mente sadia. O corpo saudável era aquele comedido, em que os valores se encontravam em sintonia com o Cosmo. E este equilíbrio os colocava em relação sincrônica com o divino. É simplesmente através deste processo lógico, que os filósofos em geral procuravam compreender e admirar a ordenação das coisas. Dessa maneira, a razão tinha um lugar preponderante naquela sociedade e entre aqueles povos, pois se tornava admirável diante da compreensão, da conquista e revelação do exercício da teoria como instrumento de admiração, contemplação e entendimento diante da ordem cosmológica. Cabe aqui, fazer uma melhor explanação sobre a palavra teoria para os filósofos estoicos, pois teoria seria a junção de outras duas palavras gregas Theion (divino) e orao  (eu vejo). Portanto, The-oria seria “eu comtemplo o divino”.

A relação dos filósofos estoicos com a admiração ou contemplação mencionada era ao mesmo tempo lógica e racional, porque era a partir da razão que se estabelecia o entendimento sobre o “logos”. Antes da filosofia estoica os gregos recorriam aos deuses para entender o universo. Porém, com o advento da razão os gregos passaram a recorrer à lógica racional para ver o essencial do mundo. O logos na, na verdade, era a essência do principio da razão e por isso divino. Afinal de contas, para eles não significa que este cosmo ordenado e harmonioso seja uma criação esplendida, o que a nosso ver seria criação de Deus. Para os estoicos não é bem assim, o mundo e suas maravilhas, não seria uma criação de Deus, pois estas maravilhas de maneira análoga representa um ser animado e organizado semelhante a um organismo vivo. Porém tais maravilhas são exteriores ao homem e por isso é cosmológico e divino.

Para os filósofos gregos (estoicos) o homem seria capaz de atingir a salvação apenas através do “logos” e por conta própria. Se pudéssemos ouvir um filosofo estoico discursando, estas seriam certamente suas palavras, “somente em ti encontrará as armas capazes de libertá-lo das armas da nostalgia e da esperança, sentimentos que aprisionam o pseudofilosofo, pois o verdadeiro filósofo não se detém diante de sentimentos de esperança e nostalgia”. É espelhando-se apenas na natureza que o filosofo se tornará compreensível com o mundo a sua volta, fazendo uso desta compreensão o mesmo passa a entender o conhecimento, os valores e atinge a própria salvação, que só será possível através do exercício da sabedoria (theorein). Não há espaço para um Deus pessoal, individual, a filosofia estuda o todo e não partes, o sentimento de um deus individual destrói a ideia do cosmo, como unidade harmônica e ordenada. Por essa razão os filósofos estudam astronomia, biologia, física... para mostrar o universo como um todo organizado.

Saindo um instante da teoria filosófica estoica e entrando na teoria do conhecimento do mundo desenvolvida pelos cristãos, veremos que estes nos revelam que o logos é o verbo e que o verbo é Cristo. E que Cristo é o divino que se faz Deus e que este se faz Carne (homem) e habita entre nós. Essa construção teórica ainda vai muito além e submete o logos grego (razão) a fé. Relegando a razão (Logos) para um lugar de descrença, sendo que a esta não caberia exercer a função enquanto instrumento de exercício do intelecto humano.

Com o advento e expansão do pensamento cristão é este o quadro que se apresenta. Os cristãos acreditavam, nos revelavam e nos advertiam, que seria preciso um esforço de fé e confiança no Cristo (analogia do logos estoico) para que pudéssemos galgar a plenitude da vida, superando a morte, conquistando a vida eterna e a feliz ressurreição, que só seria possível através do amor, da comunhão e da compaixão que nos é ofertado na figura do Cristo.

A figura de Cristo e não mais o “logos” constituía-se assim a única fonte capaz de nos relacionarmos com o divino (Deus) para em seguida praticarmos a “boa nova”, isto é, a mensagem trazida e pregada pelo Cristo Salvador (logos estoico). O logos que os gregos acreditavam orientá-los na caminhada para a conquista de uma relação harmoniosa com o Cosmo é substituído radicalmente por uma ética de valores universais, baseada na liberdade como instrumento do livre arbítrio, que será ensinado pelo Cristo, instituidor do axioma “amar o próximo como a si mesmo”. Portanto, é somente através do exercício contínuo destes valores pregados a partir da figura do Cristo, que conseguiremos superar a morte, ou seja, somente através da doutrina da salvação no “logos”, que se dá através de um processo de amor e compaixão em Jesus Cristo (logos cósmico encarnado).

Segundo os teóricos cristãos, Jesus Cristo, após a morte, ressurge diante dos seus. Esse acontecimento, serve de base para provar, que somente através da persistência religiosa, a prática do amor e a humildade traduzida na figura de Cristo (logos encarnado) seria possível superar a morte, ressuscitando para a vida eterna. Esse ressuscitar representa uma possibilidade concreta dos homens se reencontrar com os entes queridos.

Todavia, para que a ressurreição se apresente como algo possível aos homens, esse teriam que cumprir e seguir princípios básicos, como:  amor ao próximo, desapego dos bens materiais e o constante exercício da fé em Deus (Cosmo/Divino). Cristo seria a própria encarnação de Deus, que se fez homem para habitar entre nós. Cristo nesse caso substituiria a ideia do Cosmo como uma ordem justa e boa, a partir da superação da morte pelo exercício do amor, que seria um sentimento vivo e que habita nos homens e que os torna imortal.

Bem, como compreender tão radical ruptura no modelo de compreensão do universo. Certamente, os estoicos perguntaria, que racionalidade ilumina a mente dos cristãos para anunciar, tais “verdade”. Para os estoicos, Cristo não poderia ser o modelo de harmonia cósmica, pois não há como uma parte representar o todo. Não há como algo que se diz transcendente, ocupar um lugar de imanência, pois a imanência em relação ao mundo se dá, quando algo se relaciona apenas com o mundo.

Ouso afirmar, que seria impossível para um filosofo grego aceitar argumentação tão complexa, ou melhor, absurda. Para os estoicos, o divino jamais poderia transcender, já que representava o Cosmo e este seguia uma ordem, onde a natureza representa o verdadeiro modelo ético e ordenado da razão. E que só esta (natureza) nos forneceria o conhecimento cosmológico, capaz de nos conduzir a conquista da sabedoria. E nos ensinar, a superação da morte só seria possível através de exercício de compreensão do logos racional, buscando-se a conquista do entendimento do Cosmo belo, ordenado, justo e divino.

Dessa forma, para os estoicos, o homem constituiria um elemento essencial nesta ordenada relação cosmológica. E a consciência do seu lugar no Cosmo só seria possível com uma boa bagagem teórica a cerca do mundo cosmológico. Consequentemente, esta sabedoria teórica garantiria a superação da morte como elemento de passagem para o infinito, conforme asseguravam os cristãos, pois para os filósofos estoicos a verdade sobre a morte é que ela seria uma finitude física, que não esgota por si mesmo a atemporalidade do Cosmo. Cada homem representaria, uma parte do todo cósmico e não uma parte isolada do mundo divino.

Contrapondo-se aos gregos surgem os católicos cristãos afirmando que, o divino é Deus e que Deus se faz homem e que este homem é Cristo seu filho - o logos encarnado. Este conflito teórico, gerou uma desordem na sociedade da época, que consequentemente desencadeou uma mudança total de postura. Pois, segundo os cristãos a superação do “logos” por Cristo seria a porta de saída para a superação do problema da morte.

Enquanto os estoicos, diferentemente, buscavam em si, através da sabedoria, uma saída para superar esta “carnívora assanhada”, os cristãos diziam o contrário, que somente em Cristo é possível superar a morte, e diziam mais, Ele representa o caminho, a verdade e a vida. Somente por Cristo se alcançaria a salvação pessoal e material, gozando do privilegio de poder rever os seus no paraíso eterno, onde todos são iguais perante o divino.

Como ordenar esta sociedade que busca em um ser transcendente, contrapondo-se ao imanente, uma saída lógica, no sentido racional, uma saída para a morte, que seria a finitude humana. Pois bem os cristãos irão prometer aos mansos e humildes de coração o reino dos céus e a superação da finitude através do exercício do amor em Cristo Jesus. É o verbo que se fez “logos” vivo e que representa a prova e verdade inconteste da superação da morte pelo amor. Contudo, esta verdade só será possível se creres, que Cristo é o único salvador (fora dele só há trevas).

O axioma “eu sou o caminho a verdade e a vida, ninguém vai ao pai se não por mim”, ao longo dos tempos se sobrepôs ao axioma estoico “corpo sadio mente sadia”. Mas, emergindo o modelo de contemplação e questionamento estoico, pergunto como aceitar que a salvação não está na nossa relação harmoniosa com o Cosmo? Como descontruir a ideia de que a superação, diante da finitude da morte, não se dá através de um processo de sabedoria lógica racional?

Aqui, registro meu olhar pessoal, acredito que a filosofia se apresenta como um caminho capaz de conduzir o homem a superação da morte. Desde que, este aceite a morte como parte constituinte do Cosmo (universo), em detrimento de um processo de fé no Salvador, que mais representa uma solução que pertence a outrem e não uma saída a partir de si. 


* O texto ora publicado é de autoria de Luiz Alberto Santos. Formado em Pedagogia pela Faculdade Pio X, Pós-graduado em Psicopedagogia e Direito Educacional pela mesma instituição e Graduando do curso de Filosofia da UFS. A mim coube a tarefa de postar o texto e a imagem que julguei adequada, além de ceder o espaço para publicação.