quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

AMOR VISUAL



Nasci em uma época, onde:
somente se ama,
aquilo que se vê 
a olho nu.
É a fachada que diz a casa, não o avesso.
É o tamanho da mesa que diz a fartura.

Logo, beijar
só de olhos abertos,
ainda que seja, somente um,
não é falta de romantismo,
é prudência!

pra não colher espinhos,
invés de rosas,
pra não beijar boca:
suja,
enegre[cida]
[des] dentada
[des] possuída
[des] colorida
des...

As pessoas - diferente dos metais - quem as definem?
São as cores e não os sons.
Afinal, tudo que reluz é ouro.
Portanto, quem desejar amar,
feche os olhos e assuma os riscos.

Riscos [de]:
sujar os lábios,
vê cair a noite,
contrato sem papel...

E, por derradeiro,
habitar
casa escura,
sem portas, 
sem janelas,
sem flores,
sem vida...

Todavia, 
repleta de amor,
beijos 
e olhos fechados.



[José Ailton Santos]


segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

PARTIDÁRIOS DE QUEM...




Permita-me insistir em um debate repisado. Ontem ouvir de uma pessoa de reputação inquebrantável, que o Brasil é uma democracia liberal. Encaracolei meus neurônios diante de tal afirmativa. E, caso tivesse oportunidade de lhe perguntar algo, seria, certamente, que fizesse uma melhor explanação do que entende e acredita ser uma democracia liberal. Pois, quero não acreditar que esse troço, que envolve palavras tão antagônicas como Democracia e Liberalismo sejam, sinteticamente, a ação de “cada um vota em quem quiser de acordo com seus princípios e inteligência e sem ter que dar satisfação a ninguém”.  

Honestamente, se pensarmos que num país onde 54 milhões de indivíduos – não posso nem chamar de cidadão – vivem abaixo da linha da pobreza, ou seja, miséria total. E, sem falar que estamos nos referindo a mais de um quarto da população brasileira. Diante desse quadro, será que esses se encontram, verdadeiramente, em condições de discernir qual candidato é melhor para o país, o estado ou o município? Talvez, a pessoa de opinião inquebrantável desconheça o mundo da semiótica, dos discursos, dos anúncios publicitários, da fome, da pobreza, da informação e contra informação e, por fim, o mundo do poder e seus efeitos na hora de escolher o melhor candidato.

Agora, pergunto a você leitor deste blog – será que já ultrapassamos a meia dúzia - o que leva tantos homens [também tem aumentado o número de mulheres] a consumirem cerveja e cigarro, no Brasil e no mundo? Suponho que seja fruto, apenas, de uma decisão pessoal, sem ocorrência de qualquer influencias externas. Será? Convido-o a viajar pelo mundo fascinante da especulação. Vejamos, porque será que existem tantas campanhas publicitárias de cervejas e sempre associadas à imagem da mulher “coisificada” como elemento central? Seria por puro acaso ou será pelo elemento da sedução dos sexos?

Insistindo ainda mais no exemplo, será mesmo que as pessoas consomem cerveja, simplesmente, por força de uma escolha individual? Afinal, “não tem que dar satisfação a ninguém”, então pergunto, por que será que as cervejarias e a indústria do tabaco investem – não se assustem com a palavra, é assim mesmo que os investidores consideram, como um investimento - tanto em publicidade?

Desculpem o uso exaustivo desse exemplo comparativo grosseiro, mas, por hora, foi o que me veio em mente. Pois bem, voltemos à discussão inicial. Toda minha fala nesse diálogo, tal qual um discurso político partidário, está carregado de intensões e significados – não foi à toa que me esforcei tanto na exemplificação -, que, às vezes, ignoramos e sem perceber reproduzimos inconscientemente. Diante desse fato, constatamos que precisamos investigar melhor os fenômenos que envolvem os discursos, principalmente, quando partem de alguém aparentemente confiável. Pois, somente procedendo assim, poderemos extrair ou filtrar as ideias claras e as que se apresentam de forma implícita ou subentendida.

Então, não podemos ser ingênuos ao ponto de achar que certos problemas – na opinião da pessoa de reputação inquebrantável - não são resolvidos, “porque simplesmente não há interesse em resolvê-los”. Ora, interesses é o que não faltam, e são os mais variados possíveis. Agora, o problema, a meu ver, é conciliar esses interesses e de quebra realizar o pretendido. Afinal de contas, tudo, neste Brasil do Carnaval, do Futebol e dos recessos judiciários e parlamentares, depende da correlação das forças em jogo em cada momento histórico. E, quase sempre, o jogo é ganho nos minutos finais da prorrogação e com a “ajuda” custeada do juiz.

Ainda dialogando com a pessoa de opinião inquebrantável, quando este diz, “os governos do PT não têm nenhum compromisso com o país e com a classe trabalhadora”. Percebam que o direcionamento continua no campo da política nacional, logo, continuarei fazendo uso do mundo fascinante da especulação, melhor seria imaginação. Acredito, a partir do meu raciocino limitado, que Lula, Dilma e tantos outros denominados como a nova esquerda brasileira, até tenham interesse em implantar o projeto social defendido durante a campanha política. Todavia, a questão principal é que a realização desse projeto entraria em choque direto, com os interesses econômicas da classe hegemônica - para não usar o termo cansado da burguesia - nacional. E, sem o apoio dessa classe, ainda que condicionado, o governo do PT se tornaria engessado.

ESTAÇÕES



Conheci Diana numa Primavera,
dentre tantas cores era a flor perfeita
aroma de rosas e olhar a espreita.
Naquela manhã feliz, chovera.









No Verão passado, secou a flor
tão frágil! Não resistira ao calor
de tanto desamor.
E as lembranças minhas? Clamor!








Cair por terra aos prantos,
como caem as folhas [seca] no Outono
e, sobre jardins e flores, escrevi contos.








O Inverno chegou,
ressurgi dos prantos.
Diana, feito estações, voltou.

domingo, 16 de dezembro de 2012

O MOVIMENTO SINDICAL E SEU DESENHO ATUAL: do equívoco ao oportunismo.




A chegada de Lula ao governo federal fomentou a seguinte discussão no seio do movimento sindical, especificamente, nas correntes e tendências dos sindicatos cutistas, mas não somente dos sindicatos ligados a CUT. Insira-se no caldeirão a CTB, CONLUTAS/INTERSINDICAL... como produto dessa discussão classista restou uma pergunta, que ficou no ar, como seria desenvolvida a atuação das centrais? Visto que, tratava-se de um governo de esquerda, se não em ideologia e/ou projeto de governo, é inegável que ao menos em origem, dada a trajetória do seu líder maior. Afinal de contas, a história do chefe do executivo que chegava ao poder sempre esteve ligada a classe trabalhadora e as vertentes ideológicas ligadas ao Socialismo.

Superada a fase das indefinições, optou-se por dar sustentação ao governo. Daí, os líderes sindicais entraram numa espécie de estado de indiferença a cerca das questões de impacto sobre a vida da classe trabalhadora. Sem dúvida,  esse foi um período de grande desgaste dos sindicatos com suas bases, pois essas estavam sendo dissuadidas que o momento era delicado e que seria um risco "ir para cima do governo". Afinal, a classe dominante do país estava alerta e à espera de um deslize do governo federal para encabeçar um movimento de destituição do mesmo.

Ledo engano, o tempo mostrou que estes sindicalistas estavam errados a cerca da ideia de atrelar a classe trabalhadora como se esta fosse "correia de transmissão" do governo, quando na verdade, deveriam era usar a força do movimento classista para pressionar este mesmo governo para votar as reformas politicas e sociais urgentes para o Brasil e para a "classe-que-vive-do-trabalho". Daí, enquanto o movimento sindical silenciava e perdia espaço nas mobilizações nacionais, a classe dominante sufocava o governo exigindo o atendimento dos seus interesses imediatos, a saber, elevação dos incentivos fiscais, auxílios financeiros, et cetera. Esse fato obrigou o governo federal a estabelecer alianças políticas para manter a governabilidade, ao passo, em que descaracterizava seu projeto de governo inicialmente traçado, com foco na classe menos favorecida.

A partir dessa correlação de forças  que se estabeleceu, o governo ficou sem o apoio popular necessário para encaminhar e aprovar no Congresso Nacional as reformas, as quais o Brasil necessitava e continua necessitando, urgentemente, para crescer economicamente e tornar-se uma nação socialmente mais justa. Dentre as reformas, cito a política, tributária, sindical e, por que não citar a quase esquecida, a reforma agrária, dentre outras. Enquanto isso, as centrais abandonaram as lutas e deixaram de cobrar da forma devida do governo, fato esse, que nunca deveria ter acontecido, pois gerou um desequilíbrio na correlação de forças em atrito historicamente no país. 

Por conseguinte, houve redução nos gastos públicos e perdas de direitos sociais, compensados com paliativos econômicos - de caráter assistenciais - concedidos pelo governo - que historicamente combateu esta pratica - com fins, exclusivamente, eleitoreiros. Esta manobra do executivo, inclusive, fora interpretada equivocadamente por muitos lideres sindicais como privilégios sociais, numa clara demonstração de erro de condução, ao fazer opção pela sobreposição da política partidária sobre o movimento trabalhista, retirando deste sua autonomia e a força de agente de transformação social. Esta situação para alguns analistas, além de ter adiado, desestabilizou aquilo que seria o início de uma caminhada rumo ao Socialismo ou ao que se poderia chamar de democratização social.

Fato é, que a maioria dos sindicalistas ao optarem em dar sustentação ao governo atrelando os sindicatos e  as centrais aos partidos políticos, proporcionaram retrocessos gratuitos à classe trabalhadora. É preciso deixar claro que a relação entre partidos e entidades de classe deve ocorrer, porém deve haver a independência de ambos e sem atrelamento de um ao outro. E, no segundo governo Lula, quando se esperava uma mudança de postura, o que se viu foi um aprofundamento dos erros do primeiro governo, ou seja, os dirigentes sindicais que foram cooptados, num primeiro momento, para o alto escalão do governo sem a devida reserva, instantaneamente, retirou a possibilidade dos sindicatos prepararem novas lideranças para continuar conduzindo o movimento. Foi um tiro no pé dos trabalhadores.

Dessa forma, relegou o sindicalismo ao amadorismo de pessoas bem intencionadas, porém sem habilidade para dialogar com as bases, com os patrões e com o próprio governo. E, por fim, diante desse quadro, a quem coube a tarefa de "partir para cima do governo"? A tarefa ficou a cargo dos partidos de oposição, alguns nanicos, outros de grande envergadura, contudo sem credibilidade e desgastados e, por último, centrais sindicais sem grande expressão junto a sociedade e a classe trabalhadora. Oposição está, que, possivelmente, só ocorreu por conta da ausência de espaço no alto, médio e baixo escalão do governo para acomodar a todos, logo, sem carinho na cabeça e tapas nos ombros, esses ficaram batendo nos pés do gigante no intento de chamar sua atenção.

Consequentemente, se estabeleceu entre os líderes sindicais, que por sua vez, eram militantes históricos ligados ao partido no poder [ou seria mais acertado partido no governo], uma corrida em direção as tetas do governo, que, diga-se de passagem, abundam regalias. A pergunta que se fiz na ocasião, nas raras oportunidades que tive, e que a faço novamente é a seguinte, como não cair no casuísmo de taxar esses militantes de traidores? Como não tratá-los como pessoas que mancharam suas histórias de lutas, em troca de vestir ternos de grifes e se trancarem nos gabinetes da burocracia, tudo negociado tendo os trabalhadores como moeda? Agora, deixo minha última pergunta, será que o equívoco conduziu o movimento sindical ao oportunismo ou este precede aquele? 

sábado, 15 de dezembro de 2012

[DES]ENCONTRO MAIS-QUE-PERFEITO







Pousara a mão sobre a dele
e trouxera-o ao mundo;
fitara-lhe nos olhos,
espelho sem reflexo


Rolara uma lágrima, duas, três...
o silêncio tomara a ambos
e o rio na fronteira
seguira seu curso

Ausentara-se, e, por um instante
fizera-se estranho novamente,
sua mão regressara desolada

Por fim, fitara-lhe dando adeus,
recuara a cadeira e aquele olhar,
fora sua última gentileza.


[José Ailton Santos]


A QUE SERVEM AS MULHERES.



Minha esposa, certa vez, disse:

- Santo Deus, homem!
"Irmãos, amigos, 
parentes, vizinhos...
estão todos levantando uma boa grana,
trabalhando feito loucos,
aproveitando as oportunidades".

- Porque não usa seu talento
e faz o mesmo?

Não disse nada,
fiquei calado feito Cristo, 
para não magoá-la.
Mas, ainda pensei em dizer-lhe,
alguns instante e abandonei a ideia.

Em silêncio, monologuei
"a velocidade não faz ninguém
bom piloto, a maestria sim".

Sinceramente, não gosto de correr
prefiro caminhar
e, com sorte, parar
ficar sentado à sombra do juazeiro
e apreciar o movimento do vento
e o canto do Bem-ti-vi
e o dançar das borboletas
                    [nunca mais as vi, o que houve?]

Por que as mulheres nunca me entendem?

Decididamente, não gosto de gente
gosto dos amigos ausentes,
meus livros
e um copo d'água da moringa,
não preciso de dinheiro.

Habitualmente, não colho fruta no pé
prefiro as já colhidas
de preferência,

descascadas,
lavadas,
cortadas em bloco
em prato limpo
e servido na boca

por uma mulher cheirosa
de mini saia
e que não me diga nada
definitivamente, nada!


[José Ailton Santos]
                     

A VIDA AOS OLHOS DE UM LOUCO PENSA[DOR] *





Diria os mais ingênuos e socialmente respeitáveis que a vida é uma coisa maravilhosa ou que é um presente de Deus aos homens, ou ainda, como dizia o poeta “ela é uma doce ilusão”. Todavia, desconhecem estes doutores do saber, que a mesma é um conceito muito amplo e que admite diversas definições, inclusive, definições pouco agradáveis. Biologicamente, e de modo enxuto, Darwin diria que ela não passa do lapso entre a concepção e a morte de um organismo.

Mas, aos olhos de um modesto pensador [ou seria pensador modesto], a vida nada mais é do que um ato de covardia.  Explico melhor, quando alguém atenta contra outro pelas costas, não dando ao mesmo, condições de defesa, não denominamos este ato de covardia? Então, de forma semelhante, somos jogados no mundo sem direito de escolha, sem ao menos sermos consultados se queremos a vida, sem ao menos podermos discutir as condições com as quais teremos que viver. Além desses aspectos apontados, há o inconveniente de quando estamos no melhor da festa [olha aqui mais um conceito para a vida] somos despertados pela algidez da foice da morte, isso quando não somos interrompidos antes mesmo de nascer.

A verdade, ou aquilo que entendo como verdade, é que não há espaço para conceitos nem opiniões. Sequer sabemos como e onde tudo começou, ou ainda, de onde viemos? Qual o propósito? Onde estávamos antes do começo e para onde vamos depois do fim? Argumentos há em demasia, teorias são várias, mas não passamos disso, nem um passo além das fantasias socialmente aceitas. Nada sabemos ao certo, salvo os religiosos dogmáticos. 

As certezas tornam-se dúvidas e o mesmo poeta, vez por outra, muda de opinião e diz, “ela é maravilha ou é sofrimento, ela é alegria ou lamento”. Mas, certo só as surpresas, o imprevisível, os bons e ruins momentos. Cansado de seguir as borboletas, o modesto pensador sentou à sombra de uma árvore e ressonou longamente. Despertou com um passarinho azul feito arauto declarando que a vida era uma tarde chuvosa, onde o Sol por mais que desejado, teimava em não aparecer.

O poeta, neste instante, lembrou-se da aula, com a sala vazia, que tivera com Arthur Schopenhauer na Universidade de Berlim, quando este falava sobre o homem e a vida. Falava o professor que a vontade humana inexiste, e, ainda que se tentem atribuir causalidade as ações humanas e a vida, o que existe é um impulso de preservação. Nada na vida reflete a vontade humana, daí viver não passa de sombras de uma volição distante, seria algo comparado as sombras do mito platônico da caverna. 

Se a vontade que julgava ser minha é resultado de uma vontade prévia e alheia, a quem pertence o sentimento adquirido na vivência com outras pessoas? Qual a relação do tempo com esse fenômeno? Qual a razão de tanto esforço humano? Para que acumular riquezas, amores, se no melhor da festa não poderemos beber uma última taça. Decididamente, não quero a vida e sim a morte, contudo, antes de morrer pedirei a Soren Kierkegaard explicações sobre a morte.

Certamente, a esta altura, o poeta está bêbedo, o louco pensador curou-se da loucura e o leitor abandonou o texto, pois se não sabemos o que vem a ser a vida, quiçá a morte. Respondo, a vida pode ser uma infinidade de cousas como ficou claro nos diferentes conceitos. Mas, e a morte? A resposta vem em seguida, a morte é um punhal e, como tal, só fere e sangra a carne, mas é incapaz de penetrar na alma humana.


* Este texto é uma adaptação das ideias expostas a mim por meu muy amado primo, Ângelo Aragão.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

PALAVRA, PÃO QUE NÃO ALIMENTA


Não escrevo para burguês
nem para intelectual classe média
Tão pouco para os donos do capital,
nem pensar!
Meus escritos não geram proventos.
Aliás, esses não suportariam meus escritos
Seus estômagos são sensíveis demais.
Escrevo sim,
para o pobre,
o desabrigado,
o infeliz esfomeado,
e, em último caso, para mim.
Esses sim têm estômagos fortes,
resistentes, adaptados a penúria
Encarnam um tipo de Darwinismo da sarjeta
convivem com a fome,
Teimam com a miséria
e riem da morte que os temem.
Deus não suporta suas criticas
sobre o mundo e os homens,
Ou melhor,
sobre os homens no mundo.
Sobre a imperfeição da obra divina.
Somos todos canibais!
Confesso, particularmente
não pretendo alimentá-los.
Minha palavra é requentada.
Minha real intenção
é deixa-los ainda mais famintos.
Para quem sabe,
vê-los devorar uns aos outros e a si mesmo
Ou àquilo que não vêm,
por hábito, como alimento
Ou àquilo
que vêm como seu único bem,
a vida!
Meus escritos é minha obra de caridade
Mas, não a faço por amor
ou humildade.
Afinal, Não sou hipócrita
nem tenho encargo de consciência
Faço-a por fúria e revolta
E para saciar meus demônios.
Pois que, nesse mundo de pão e fome
não há generosidade
O que há
são palavras agrupadas
Feitas de farinha de trigo, fermento e água
À luz do Sol e numa sombra privada.


O LABIRINTO

_ Por que choras homem?
_ Porque quero sair do labirinto 
e não encontro a saída.
_ Mas, fora do labirinto não há vida.
E se não há vida lá fora
por que deseja sair?
_ Porque no labirinto
há vários caminhos que não levam 
a lugar nenhum
e quero encontrar
um, um só apenas,
que me conduza a saída.
_ Não entendo,definitivamente,
não entendo!
A beleza do labirinto
é justamente esta
perceber os caminhos que levam a lugar nenhum.
_ Não chores homem!
Pois, a vida lá fora
é o pior dos labirintos.
Lá fora não há caminhos 
nem saídas.
Somente um abismo infinito.
_ Como pode ter tanta certeza
naquilo que diz?
_ Ouça! Muitos lançaram-se no abismo
e nenhum, nenhum, nenhum
até este momento
jamais retornou para dizer o contrário.

STF: HUMANO, DEMASIADAMENTE HUMANO!*



Recentemente, foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal [STF] a Ação Penal 470, midiaticamente conhecido como Julgamento do Mensalão, que gerou opiniões as mais distintas possíveis e monopolizou o debate nos espaços públicos e privados por vários meses, deixando de lado, acontecimentos importantes e de extrema relevância para a população nacional, como o debate político nas eleições ocorridas neste ano e a paralisação quase completa dos trabalhos legislativos no Congresso Nacional, até mesmo a conquista do Campeonato Brasileiro, de forma antecipada, pelo Fluminense foi apagada pela importância quase divina do Julgamento no STF, sem olvidar que futebol é paixão nacional.

Grupos políticos - divididos em uma infinidade de siglas partidárias -, setores econômicos e financeiros, diferentes segmentos sociais, intelectuais, jornalísticas, uma infinidade de formadores de opinião, todos cuidaram logo de se posicionarem e emitirem pareceres sobre o tema [raros os que são conhecedores da ciência jurídica]. Uns assumindo uma postura de defesa em relação à acusação que pesava sobre os réus e alegando que os ministros julgavam sob influências externas as paredes do tribunal, possivelmente, cedendo ao apelo popular, que por sua vez, estava a endossar o discurso urdido pela grande mídia nacional elitizada. Aqui, abro um parêntese, mídias estas que são concessões ad eternum a grupos econômicos e a senadores e deputados nos diferentes estados do país.

Por outro lado, outros apontavam as acusações contra os réus como merecidas, atribuindo aos mesmos o adjetivo pejorativo de corruptos e destruidores da democracia e da ética nacional. No mesmo ruído, deram aos ministros um status de heróis nacionais, ou mesmo, de restauradores da ética na política. Na verdade, independente do lado em que se posicionaram, contra ou a favor, a intenção era a mesma, isto é, todos queriam tirar proveito de alguma forma das opiniões expostas. É o velho jogo político, onde interesses públicos e privados se misturam, sendo que estes últimos sempre acabam prevalendo. No entanto, um número ínfimo, pouquíssimo, refletiram sobre a forma e os critérios que resultaram na sentença dos réus. Por hora, não estou a me manifestar se fui contra ou a favor, não é essa a direção que pretendo dar a este texto. 

Aliás, penso que este seja o aspecto de menor relevância no que tange a Ação Penal 470. Também não pretendo analisar os tramites do processo, pois todo julgamento, a rigor, deve seguir alguns procedimentos contidos no ordenamento jurídico, dentre eles, o direito de defesa, o contraditório e a ampla defesa. Afinal de contas, caso isso seja ignorado, o julgamento será considerado de exceção, fato que para uma sociedade dita democrática é uma coisa impensável, uma afronta aos direitos humanos e [a uma palavra cada vez mais popular] a República.

Vejamos, suponho ser do conhecimento do cidadão medianamente esclarecido que é inegável a pressão existente sobre o STF. Porém, histórico e culturalmente, essa forma de pressão é mascarada por relações afetivas presentes no sistema judiciário entre ministros e advogados, bem como entre aqueles e alguns políticos. Situação que tem contribuindo com o descredito do poder judiciário perante uma parcela expressiva da sociedade brasileira.


E, diante dessa situação, alguns podem se perguntar se o julgamento da Ação Penal 470 julgou as práticas atribuídas aos réus ou alguns membros de partidos, a saber, políticos ligados ao Partido dos Trabalhadores [PT]? De pronto, aproveito a ocasião para lançar uma indagação, será que o STF julgará com tamanho vigor a ADIN [Ação Direta de Inconstitucionalidade] impetrada pela OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] nacional que visa por fim ao financiamento de campanhas políticas por empresas privadas? Uma das fontes geradoras da corrupção na política brasileira.


Guardem no oxigênio estas e outras indagações, pois, doravante, vou me ater a refletir sobre o caráter, o papel e a importância dessa corte excelsa na sociedade brasileira ou em qualquer sociedade que se intitule democrática. Afinal de contas, não obstante sua importância, enquanto instituição zeladora dos princípios constitucionais pétreos e dos alicerces do sistema democrático, ao menos no aspecto jurídico, não se pode atribuir à mesma um aspecto supra-humano. Caso isso ocorra, imaginem os riscos de tê-la em tão elevada conta? Seria catastrófico.

Vou isolar para análise dois personagens centrais no chamado julgamento do mensalão. Um, o ministro relator Joaquim Barbosa, e o outro, o ministro revisor Ricardo Lewandovski. O primeiro, talvez, seja o grande personagem dessa trama, visto que, protagonizou cenas de embates fortíssimos, às vezes, adotando posturas de total deselegância para com os pares, acusando-os inclusive de não jugarem da forma devida. O que representa uma afronta, além de soar como intimidação.  Barbosa condenou a quase totalidade dos réus e adotou como tese [que, por fim, fora questionada pelo próprio autor da teoria] o “domínio do fato”, onde segundo esta teoria, grosso modo, não precisaria haver provas para que um réu pudesse ser condenado.

Particularmente, não vou tecer maiores comentários sobre o que venha a ser a tal teoria para não incorrer no risco de criar uma terceira ou quarta interpretação, deixo a tarefa para os mais hábeis. Todavia, o ministro corajosamente condenou os réus, mesmo havendo margem na jurisprudência nacional para considerar os mesmos inocentes. A tarefa de inocentar parte dos réus ficou a cargo do ministro Lewandovski, que usou como tese a ausência de provas claras e objetivas contra os acusados. Ainda segundo esse, acreditasse   haver fortes indícios que os réus são culpados [ele particularmente assumiu em público que suspeitava da participação dos réus na trama ilícita], mas que não existe na legislação vigente leis que garantam a condenação dos acusados.

A quais conclusões se podem chegar? Será que houve uma condenação amparada em um sentimento personalíssimo, soando como uma possível retribuição aos clamores sociais? Será que se repetiu o julgamento de Fernando Collor de Melo, onde este, mesmo tendo sido inocentado no STF ainda assim foi deposto, por força do movimento dos “caras pintadas”? Será que a justiça prevaleceu ou equívocos foram cometidos?

Uma coisa tenha como certa, o caráter do Supremo Tribunal Federal deve ser pautado em ações impessoais, que julguem os fatos e não pessoas nem cedam a apelos externos, independe de onde partam. Pois, essa instituição é de vital importância para o amadurecimento, fortalecimento e solidez da sociedade brasileira e sua fragilidade só interessa a setores particulares, que na disputa de forças sociais, caso não haja um terceiro para arbitrar o conflito, serão os grandes vencedores. Por conseguinte, o papel do STF é deliberar sobre questões constitucionais e não sobre situações políticas, essas cabem ao Congresso Nacional, se este zelo não existir corre-se o risco de haver uma judicialização da política, como muitos já apontam, o que seria comprometedor a independência e harmônia do poderes.

Por fim, como li certa vez, nas palavras de um criminalista e ex-ministro do STF, Evandro Lins e Silva, o direito quase sempre – ou sempre - representa os reflexos de um povo. Daí, se este mesmo povo se apresenta maduro o direito segue pelo mesmo caminho, contudo se o povo se desobriga de participar e se mostra hesitante ou apático, o direito refletirá esse mesmo estado. As decisões emitidas pelos tribunais buscam sempre equilibrar o que está previsto nas leis e o sentimento médio da população. Afinal, não devemos esquecer que os operadores do direito são humanos, demasiadamente humanos. 


* O título foi inspirado na obra do filósofo alemão Friederic Nietzsche.