Não sou dos
melhores analistas sociais, isto é um fato, nem tenho know how em história
comparada dos povos e nações, contudo mesmo não o sendo me proponho a praticar
e compartilhar minha análise do Brasil atual e suas enormes semelhanças com
pecados cometidos contra a humanidade por outros povos em tempo e espaço diferente. Na mesma toada de
Agenor de Miranda Araújo Neto, popularmente, Cazuza, "eu vejo um museu de
grandes novidades" e, digo mais, com telas enormes de sangue, dor e sofrimento.
A chegada
do novo presidente ao poder, levou a sociedade brasileira ao estado de ebulição máxima num estalar de dedos, a saber, temas como: redução da maioridade penal, armar
ou desarmar as pessoas, prender ou matar “bandidos”, cortar ou não investimentos
em áreas aparentemente “obsoletas” e pouco rentáveis para o Estado; esses são apenas
alguns dos temas que põe ainda mais calor no caldeirão já com níveis elevados de
fervura.
Reduzir a
maioridade penal é receita para fazer o bolo murchar? As crianças e adolescentes
deixarão de estar na “crista da onda”, somente porque poderão ser encarceradas com
menos idade? A gênese do problema da delinquência juvenil reside em pôr um
marco temporal precoce, de quando eles podem ou não mudar de um regime
prisional para outro? Peço desculpas aos que dizem sim a todos esses
questionamentos anteriores, mas os argumentos que defendem a afirmação são
muito frágeis para me convencerem a pensar me modo idêntico. Ah, sei o que vão dizer
agora. E se um desses delinquentes menores de idade fizessem isso... isso... e
isso...com você, sua mãe, sua esposa, sua filha? Como pensaria a respeito do tema? Respondo que não seria nada
legal, todavia não vejo como reverter esses acontecimentos apenas com
paliativos; câncer se combate não com paracetamol e sim com um tratamento
intenso, profundo e agressivo direcionado ao agente causador da moléstia.
Vamos
continuar nosso passeio e conversa, claro, sem perder a elegância e a
civilidade no diálogo, pois com esses ingredientes podemos discutir até sobre
política, religião e futebol. Quem deve morrer, policial ou bandido [espero que
essa palavra/conceito não possa se restringir apenas aos negros, pobres,
favelados... que abrace os bem-vestidos e com vocabulário e renda elevada]?
Minha opção não vai na direção da polarização. Acredito que deve haver uma
terceira via, onde ninguém precise morrer.
Vou trazer
mais um elemento para exemplificar o contexto do Brasil atual e em seguida
trarei as telas do museu de novidades para subsidiar meu epílogo a este texto.
Sobre quem recai a tutela dos corpos e as inclinações da natureza humana dos indivíduos?
Compete ao Estado? À Igreja? Aos cidadãos? Não sei se é do conhecimento de
todos, mas cada um dos personagens [Estado, Igreja e Cidadão] são representados
e sustentados por um modelo teórico que defende sua atuação soberana sobre o
corpo e os usos adotados pelos indivíduos em sociedade. Detalhe, acredito que
vivemos sobre a influência e fogo cruzado de cada um desses modelos.
Quando os
Judeus foram enclausurados em guetos na Alemanha nazista, entre os anos de 1939
a 1945 - já sabemos os resultados não vou me ater aos horrores - a nação estava
polarizada sobre afirmações e negações se era o caminho adequado ou não, a
justificativa era de que seria uma medida provisória de controle, besteira! A verdadeira razão estava coberta por uma “cortina de fumaça”, a intenção de origem, a saber, era o extermínio da
população de judeus da Europa.
Permitam-me cavar ainda mais fundo, William
Shakespeare, em sua obra O Mercador de Veneza, já apontava para a problemática social
da discriminação e reclusão como solução para resolver conflitos sociais endêmicos.
Quando Shylock [rico judeu] estipula que Antonio [mercador de Veneza e aval de Bassanio, que era seu amigo] assine uma caução que
exigia uma libra de carne do próprio corpo, caso o empréstimo não fosse pago, é possível descobrir
um retrato perfeito do Brasil de fuzil na mão, reservada as devidas discrepâncias. Na obra, o autor, narra o ódio entre dois
homens de religiões distintas, revela uma sociedade em estágio de patologia avançada, esse pode não ser o real estado do Brasil, mas há muitas aproximações.
Recorrendo
a outro exemplo literário, Bernardo Guimarães, em sua obra A Escrava Isaura,
disseca uma moléstia da sociedade da época com maestria. Quando a sinhá Malvina
se dirige a Isaura como se essa não fosse uma vítima dos senhores de terras bárbaros
e cruéis, pelo fato dessa ser beneficiaria de boa educação, coisa que nem toda
moça rica e ilustre da época obtinha. E, que pelo fato de ser branca e linda,
não carregava em si o estigma do sangue africano nas veias. Isaura responde as
justificativas sociais – representadas nos argumentos de Malvina - com uma simples profunda e certeira indagação, de que vale tudo isso se não passo de uma
simples escrava? Ou seja, o alimento fácil e os cuidados do dono não
representam ganhos superiores ao infinito céu azul para todos os pássaros, sejamos honestos, a gaiola não é a escolha dos pássaros e sim dos homens, que as justificam.
Vamos a
outra tela desse museu de novidades. Quando ocorreram as guerras entre negros e
brancos – Apartheid - na África do Sul dos anos 40 aos anos 90 e, de origem
embriologicamente semelhante, aos conflitos por direitos civis nos Estados
Unidos no período de 1955 – 1968, exigindo reformas que extirpassem a
discriminação racial; ambos os exemplos ocorridos no século passado. A discussão orbitava no nível em que, as mazelas sociais eram consequências da tez
de alguns em detrimento de outros, quando o que havia ali era uma disputa por
poder, regalias e privilégios, sustentadas por omissões e negações de condições
iguais a uma significativa fatia da nação que fazia “girar a roda”.
Não acredito
que pôr armas nas mãos de um povo, reduzir a idade de punir para combater alguém
que pratica atos violentos [já pensou na ideia de ser mais uma reação que impulso primevo, sugiro conceder o beneficio da dúvida],
impor comportamentos, padrões e controles aos corpos e o uso que fazemos dele, sejam saídas para curar nossa nação da metástase social em que vivemos. Nosso
povo precisa de educação [em sentido pleno], de princípios pétreos de equidade,
ética e compaixão. Um bom governo não pode cobrar do povo aquilo que a esse mesmo povo não foi ofertado; assim como um pai não pode cobrar do filho que seja honesto,
quando direciona mais pão a um que ao outro.
Torço que
nos 100 primeiros dias do novo governo, ele possa usar o dinheiro que sobrou da
ceia de Natal, não para comprar peru e espumantes com desconto e em demasia, e
sim, compre pão para os famintos, roupas para os descamisados, chinelos para os
descalços, cubra o teto das escolas, doe uniformes para militares e sem esquecer dos estudantes
e valorize os professores. Oxalá, apenas uma dessas ações aconteçam, já me sinto
contemplado.
José Ailton Santos - Licenciado em História pela Universidade Federal de Sergipe, Pós Graduado pela Faculdade Pio X em História do Brasil, Graduando do curso de Administração de Empresas pela UNIT, ex-professor efetivo da rede estadual de ensino do estado de Sergipe, funcionário efetivo do Banco do Estado de Sergipe com certificação pela ANBIMA, blogueiro, poeta de ocasião e portador da SPNDLR [Síndrome Patológica de Necessidade Diária de Leitura e Reflexão].